Reordenação urbana regenera aspectos físico e socioeconômico de áreas
degradadas
O processo pode ser motivado por políticas públicas ou ações privadas.
Rio de Janeiro, com grandes projetos impulsionados pelas Olimpíadas, e Recife,
com o Parque Linear do Capibaribe, são exemplos
As cidades e seus gestores, de
qualquer porte, perdem excelentes oportunidades de reordenação o u recuperação
de cidadania, quando da possibilidade de intervenção em seu lay-out ou
readaptação de espaço urbano. Nesta matéria, de AEC web, temos a oportunidade
de ver o acerto de duas cidades. Leiam e encantem-se.
Redação AECweb / e-Construmarket
A requalificação
urbana é um processo social e político que visa melhorar a qualidade do
ambiente e de vida nas áreas da cidade que se degradaram, por exemplo, com a
desindustrialização. “Mais do que uma intervenção meramente física, é também
uma regeneração dos tecidos econômicos e sociais. Envolve a articulação e
integração de resoluções ambientais e funcionais, de tal forma que traz para o
lugar em questão uma nova identidade, atratividade e competitividade
necessárias para a sua requalificação de forma sustentável”, define o arquiteto
e urbanista Eiji Hayakawa, sócio-diretor do escritório Eiji Hayakawa
Architects.
Segundo o profissional,
o processo de requalificação necessariamente é acompanhado de políticas
públicas. “Por mais que os investimentos possam ser oriundos do setor privado
ou de uma parceria público-privada (PPP), as iniciativas e a regulação das
regras para a requalificação urbana devem partir de políticas públicas”, afirma
Hayakawa, complementando que o processo pode gerar certo grau de exclusão.
“Para se
requalificar, há de se ordenar, pensar em nova identidade e injetar outra
energia econômica na área. Nesse processo, há sempre os que se excluem ou serão
excluídos. Mas, um bom projeto de requalificação urbana pode evitar esse apartheid social, por meio de políticas públicas
que garantam um bom equilíbrio na coexistência de diferentes segmentos
econômicos da sociedade. O bom planejamento, sobretudo, é fruto de um processo
de discussão profunda e da construção de consensos com os diferentes agentes
que atuam na vida daquele pedaço da cidade”, expõe.
INICIATIVA PRIVADA
Por mais que os investimentos possam ser oriundos do setor privado ou de
uma parceria público-privada (PPP), as iniciativas e a regulação das regras
para a requalificação urbana devem partir de políticas públicas
Eiji Hayakawa
A requalificação
não está ligada somente à atuação do poder público. Edificações privadas também
podem colaborar com o processo sem que exista um plano mais amplo para
determinada região. Há exemplos iniciados que aconteceram a partir de ações de
propriedades privadas. “Mesmo iniciativas isoladas e pontuais podem, em muitos
casos, ter a força de engatilhar um processo de mudança urbana do seu entorno”,
afirma o urbanista. Não há uma regra geral para determinar ações que colaboram
ou não para a requalificação.
Os projetos de
edifícios comerciais ou residenciais que abrem seu térreo como passagem entre
duas ruas ou como praças disponíveis aos transeuntes ilustram bem isso. “O
sucesso dessas gentilezas urbanas para requalificar determinada área da cidade
depende muito do contexto físico, social e econômico onde são propostas, além
da qualidade de como essas ideias são executadas e implementadas. Quando boas,
mas mal implementadas, elas podem trazer mais danos que benefícios ao espaço
público”, destaca.
CENÁRIO NACIONAL
No Brasil, algumas
cidades têm avançado no conceito de requalificação, como o Rio de Janeiro que,
em virtude da realização dos Jogos Olímpicos, é o centro urbano que mais
investe em grandes projetos. “Outro exemplo é Recife, com o projeto do Parque
Linear do Capibaribe, que pretende reinventar a relação da cidade com as suas
águas”, avalia Hayakawa, que destaca ainda as iniciativas adotadas por São
Paulo. “Uma delas é o Centro Aberto, onde microintervenções urbanas temporárias
permitem às pessoas vivenciar mudanças imaginadas para longo prazo e participar
da construção dos seus espaços urbanos. A cidade busca meios criativos e
instantâneos de requalificar seus espaços públicos”, exemplifica.
Praça do B32:
verdadeiro espaço público democrático, de convívio e interação na Faria Lima
Outra ação que
começa a ganhar força na capital paulista é a instalação de parklets, extensões temporárias de calçada que promovem
o uso do espaço público de forma democrática. “Posicionados em lugares
estratégicos pela cidade, eles também simbolizam e incitam uma discussão e
conscientização maior sobre a necessidade da apropriação dos espaços públicos
pelos pedestres, fator determinante para o sucesso do processo de uma
requalificação urbana”, fala o urbanista.
REQUALIFICAÇÃO X INSEGURANÇA
Mesmo iniciativas isoladas e pontuais podem, em muitos casos, ter a
força de engatilhar um processo de mudança urbana do seu entorno (...). Os
projetos de edifícios comerciais ou residenciais que abrem seu térreo como
passagem entre duas ruas ou como praças disponíveis aos transeuntes ilustram
bem isso
Eiji Hayakawa
Apesar de avançar
no quesito da requalificação, a insegurança das cidades brasileiras cria um
ciclo vicioso que as tornam cada vez mais sitiadas e menos abertas. “A
urbanização brasileira é dominada por empreendimentos imobiliários que se
fecham, criando muros e pouca relação do interior com a rua. Ao se fecharem,
nossos edifícios inibem a vida nas ruas, resultando em mais sensação de insegurança”,
destaca Hayakawa.
Alternativa
indicada pelo profissional para alterar esse cenário é o olhar da própria
população sobre seus espaços públicos. “É a fachada ativa dos edifícios, é a
vida na rua, é o controle exercido pelos habitantes. Quebrar esse círculo vicioso
é papel importante da requalificação urbana; e não acreditar que, porque é
inseguro, é impossível reordenar a cidade”, completa.
Já no exterior, o
conceito de requalificação urbana é levado a sério, pois existe a clara
consciência de que no mundo globalizado, o sucesso de um país está, em grande
medida, relacionado ao desempenho de suas cidades. “Os centros urbanos
bem-sucedidos de hoje são aqueles capazes de promover um reordenamento territorial,
gerando qualidade de vida aos seus habitantes”, destaca o urbanista.
CASE B32
Atualmente, o
escritório Eiji Hayakawa Architects participa do projeto denominado ‘B32’, no
qual uma torre comercial e um teatro circundam uma praça pública do próprio
empreendimento, localizado na avenida Faria Lima, em São Paulo. Trata-se de um
empreendimento totalmente aberto para a cidade, onde a praça pretende ser um
verdadeiro espaço público democrático, de convívio e interação na Faria Lima.
“Antes de
começarmos a desenhar o teatro, entendemos que, por sua natureza volumosa e
introspectiva, ele terminaria tendo fachadas cegas que o impediriam de se
relacionar com a praça. Consequentemente, acabaria causando impacto negativo
nos espaços públicos de todo o empreendimento”, afirma.
A melhor arma para a insegurança urbana é o olhar da própria população
sobre seus espaços públicos. É a fachada ativa dos edifícios, é a vida na rua,
é o controle exercido pelos habitantes. Quebrar esse círculo vicioso é papel
importante da requalificação urbana; e não acreditar que, porque é inseguro, é
impossível reordenar a cidade
Eiji Hayakawa
A solução
encontrada foi elevar o teatro sobre pilotis, abrindo espaço para as pessoas
circularem por debaixo dele, não apenas gerando uma continuação da praça, como
criando nova área coberta integrada ao espaço ao ar livre. “Garantidas a
transparência e a fluidez dos espaços públicos, as pessoas são convidadas e incentivadas
a explorar todas as partes do empreendimento, gerando um ambiente dinâmico, com
vida e segurança. Com a intenção de ativar mais ainda o uso do espaço,
projetamos o fundo do palco do teatro voltado para a praça, de forma
transparente. A solução permite a quem está do lado de fora olhar para dentro,
e vice-versa. Com isso, o teatro fica aberto para a cidade e origina-se uma
relação interessante e dinâmica entre a arquitetura e o espaço urbano”, detalha
o arquiteto.
“O ‘B32’ é um
projeto que pretende quebrar o paradigma da cidade murada, mostrando para a
população que é possível construir empreendimentos dessa escala e natureza, que
geram gentilezas urbanas capazes de requalificar os espaços públicos de nossas
cidades”, finaliza Hayakawa.
COLABOROU PARA ESTA MATÉRIA
Eiji Hayakawa – Sócio-diretor do Eiji Hayakawa Architects. É arquiteto e urbanista formado
pela FAU-USP e mestre em arquitetura e desenho urbano pela Columbia University,
em Nova York. Em sua trajetória profissional de mais de 15 anos de experiência,
passou por renomados escritórios como EE&K Architects em Nova York,
mundialmente conhecido por seus projetos de escala urbana, e Tadao Ando
Architect & Associates no Japão, onde trabalhou como responsável por
projetos internacionais do escritório do arquiteto Tadao Ando, ganhador do
prêmio Pritzker de 1995. Em 2009 fundou o Eiji Hayakawa Architects em São Paulo
e tem desenvolvido com os seus colaboradores projetos de variadas escalas e
natureza no Brasil e no exterior.
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